terça-feira, 20 de junho de 2017

já não corro, mas voo...





estava eu tão feliz naquele momento, o dia claro, umas nuvenzitas brancas e todas as chaminés da aldeia fumegando, brilhavam meus olhos num rosto apetecido à espera dum jovem por mim enlouquecido...no meu corpo passou o silêncio e voei como uma andorinha em busca da primavera do amor, tanta doçura nos olhos, tanto bravor no coração, tanta juventude...é bom regredir no tempo, abraçar de novo o sonho agora que sou o barco preparando-me para partir levando a recordação do amor vivido permanente no pensamento... este é o retrato duma mulher madura, frágil, triste e desassossegada, lembrando a inesquecível adolescente de pureza intacta, hoje esmorecida num lamento, trazendo em si uma luz nostálgica e enternecida no olhar...escancaro as janelas da minha alma, deixo para trás o desencanto e vou continuando a sonhar, dissipando as minhas névoas, desprendendo-me da realidade, misturando realismo, imaginação e ternura quando a vida já pesa...

natalia nuno

domingo, 18 de junho de 2017

o aroma das lembranças...





acendi o candeeiro a petróleo da mesa verde, onde permanece a jarra com um lírio à minha espera, a casa retém o cheiro a lareira acesa um hálito que tolda meu coração e a certeza... é o ninho que deixei! - uma cotovia ainda se instala no telhado arrulhando baixinho, e posso sentir em suspenso todas as vozes que ainda percorrem a minha memória, aqui fico cativa com o intento de fazer perdurar o sonho... lá fora a trepadeira assiste a tudo, urdindo cegar-me com a sua beleza... quantos degraus havia?- sete, como recordo com nostalgia!- no terraço o vento quebra o silêncio, sento-me na cadeira do pai , escrevo aos ausentes e dobro-me perante a saudade que me assalta nesta momento....há um rio de água cálida que me abraça pela cintura, e um loureiro que me despe a alma com ternura, tudo me oferecem mas me negam, tal como o tempo me nega o rosto e eu sinto o desgosto...ouço um ranger, vai agora o sol a prumo, talvez seja meu pai de volta entreabrindo a porta  e meu coração de alegria se solta, cresce o pó na minha lembrança, afasto a cortina, adentro-me em mim mesma e deixo-me a sonhar aqui na casa da ladeira...onde eu fui por inteira... criança, lírio silvestre da ribanceira....

natália nuno

quinta-feira, 15 de junho de 2017

o retorno do sonho...





ofusco-me na lembrança do teu corpo, cresce o frio das primeiras sombras...anunciam-se as estrelas nas janelas da alma, é inquietante o silêncio enquanto as horas destilam...ali ao lado desperta um pintassilgo que faz tremer as folhas, chilreando nos ramos da minha saudade, o sol deixou de incendiar as veredas do meu coração, vou seguindo o rasto do sopro da tua voz ao meu ouvido, há lembranças que me esperam , sinto-lhes o cheiro molhado das maresias e sonho com as cores das flores que me oferecias, e, assim se faz manhã na minha noite escura e esta felicidade o meu coração inunda de ternura... as laranjeiras olham-me, trazem-me frutos d' ouro e eu sonho-me menina... adoça-se o vazio, esqueço o ardil do tempo... mas, abrevia-se a minha alegria, retorno do sonho, deixo o paraíso para enfrentar o inferno...sou uma criança confusa vinda do éden da minha infância, refugio-me nas palavras como borboleta trémula, olho meu poente cinzento e volta a mim o receio de como seguir o jogo do destino dos meus passos... deixo-me ir nesta utopia que me leva...

natalia nuno