domingo, 9 de outubro de 2016

sombras...



cativa no tempo, enterrada na melancolia permaneço silenciosa, entre o labirinto que vai da distância percorrida ao presente, chegada aqui, nenhum sonho se anunciou, o pensamento abriu e fechou, ficou-se pelas sombras, as palavras batem na garganta, mas ficam-se pela ficção dum monólogo, que só as vozes das árvores conseguem julgar...tenso é o ar da espera!
natalia nuno

homehagem a
Florência de Jesus

atrás do sonho...



atrás duma porta onde já não mora ninguém há ainda um persistente sonho que se esfuma... não me atrevo a abri-la, ouve-se ainda o abrir dos ferrolhos e o coração bate demasiado depressa, o sol escoa-se atrás dos ramos que frondosos se inclinam para o chão para logo se apagarem nas próprias sombras...sob um manto de estrelas lá continua a menina no baloiço como se nunca cessasse de baloiçar, as amendoeiras ali por perto floriram, do mais nada resta, nem auroras nem ocasos, e o que eu mais amava silenciou...ali onde bebia o sol e havia cânticos no ar, e os aromas gritavam, existe a buganvília talhando uma tristeza onde a minha alma navega...cada folha, cada caule, são carícias que me acolhem.

natalianuno

segurando o vôo...




beija-lhe o rosto o último sorriso, enquanto se esfia a vida em murmúrios e gestos lentos, o coração um deserto, é quase uma estrela que se apaga no céu, a alma desejosa de soltar-se, fugindo para o recanto mais subtil da melancolia unindo-se à alma das coisas... como se o sonho ainda lhe pusesse estrelas nos olhos, senta-se à beira do caminho, respira o ar das resinas, ouve o rumor do vento nas giestas, observa a paixão das abelhas nas colmeias, o sol vai desaparecendo na ladeira, já a lua traz a noite a nostalgia dela se abeira, tudo tão dentro dos seus olhos a lembrá-la de quanto amou...e assim vai segurando o vôo para que não despenhe o corpo...ou se extravie a memória.

natalia nuno
em homenagem 
a Florência de Jesus


sexta-feira, 7 de outubro de 2016

promessas...




Será luz a nova flor que se abre? Permanece o silêncio... talvez só uma comovida flor que o orvalho resolveu golpear, num prazer desperto de levar para longe a semente, com a promessa de fazer tremer a gota de água, que a fará germinar...se te amo, é porque deixas o teu perfume a cerejas silvestres! Dá-me a tua promessa, acende meu arco-íris de prazer antes que enferruje a minha esperança e as palavras me resvalem na garganta...como um tíbio raio de sol onde a claridade já estremece.

natalia nuno

sábado, 1 de outubro de 2016

outono de recordações...



é o passado que se desenha na aura deste pensamento em vôo nas minhas mãos... enquanto os meus olhos riem, treme a água no açude e eu criança, com um tremor de asas no sangue...no reino da minha infância, o silêncio e o vento rondando nas ramas, e o chilreio lânguido do pássaro, ignoro quem voa melhor se ele, se eu... juntos pelo acaso deste sonho meu... e o clamor da minha existência vai-se apagando num outono de recordações, a idade avança sob a oculta hipocrisia de que amanhã será melhor, enquanto vou caindo como folha moribunda numa tarde declinante de inverno hostil...porque há muito foi primavera resplandecente, em plenitude... esse tempo que recordo amiúde, como um sonho perdido para sempre.

natalia nuno