quarta-feira, 15 de novembro de 2017

capricho



ontem não vimos o sol, choveu sem violência, e ficámo-nos a olhar o rio, esse rio que já é oceano, surgiram mais umas rugas nas têmporas, enquanto as nuvens se afogavam na luz morna da tarde... a noite é agora carvão e o horizonte já abraça o crepúsculo, e eu recordo o dia de ontem, pois a amizade me arrancou um sorriso...amanhã uma luz macia trará um novo dia, e eu serei o que sou por quanto tempo DEUS quiser, me enviará um sopro doce do vento para me adoçar o peito que pende um pouco para a tristeza...a vida vai-se prolongando e botões de lírio (sonhos) vão despontando... à minha janela chegam os ramos dos salgueiros, onde os pássaros aventureiros me espreitam por entre a folhagem, curvada encosto-me à parede a olhar o rio, a matar a sede, a sede de amar, meus olhos seguem o esvoaçar das aves, lembrança que lentamente se apaga, olho as flores que sugerem amor, e é aí que o sonho começa, deixo-me acariciar pelo vento, sou como a flor pela chuva seduzida, absorta em pensamentos, desafiando a vida... afinal sou real como uma flor!

natalia nuno

eu e a solidão...



a solidão chegou à estação, procurou por lugar e sentou-se à minha beira, assustada com o apito do combóio em marcha refugiou-se no meu peito, aí se acomodou mais as malas que trazia consigo, ficámos as duas caladas, logo ela insistiu que me conhecia e até à hora da partida partilharia comigo o tempo... agora que já a conheço bem, andamos de mãos dadas, nesta estação cada vez mais esbatida que é a vida, deixamos tudo para trás e partimos sem destino, levamos a saudade de épocas felizes e seguimos viagem resignadas com este tempo triste. Dizemos uma à outra: é um privilégio ter chegado à estação sem grandes desilusões, sem ter perdido a voz e ainda com um pouco de audácia neste destino misterioso da vida... assim vou desenhando sonhos, sem deixar afrouxar o pensamento.

natalia nuno

a cor do outono...



hoje não ouvi o pintassilgo, talvez porque o ramo verde onde costuma pousar se encontra nu, não houve acordes de violino, e nem a minha mão indigente e cansada quis escrever palavras macias no poema onde eu pudesse o sol emoldurar... mesmo com a coragem a desabar... retrai a mim o silêncio e o coração descompassou, minha voz voltou à mudez, também eu perdi o ramo, irreparável descuido de meus olhos sombrios, entre a folha de papel e eu... poema feito ao acaso, muito breve e muito raso, com memórias cheirando a alecrim, pedindo que não esqueças de mim...quase... o tempo outra vez de ternura,  fecho os olhos e logo a nostalgia  a fazer doer! - - com a cor do outono e a maldição do tempo a passar, como eu precisava ouvir agora o pintassilgo tocando os acordes de violino para o coração ressuscitar... e tu, ousasses vir de novo me abraçar... enquanto meu olhar se perde no ramo que era verde...

natalia nuno
foto  de claudia giraldo

sábado, 21 de outubro de 2017

pedaços soltos...



deixa-me o sabor da tua boca, acaricia meu rosto fatigado na tarde lenta em que as minhas mãos tecem palavras de loucura, como se rezassem!...olha-me com espanto, como se eu continuasse a ser o teu encanto, nua ou vestida percorre a minha pele, poro a poro, afunda-me no teu peito com aquele jeito, com que eu sempre coro...não me deixes neste silêncio estranho, ou no vendaval onde me dobro para não quebrar, o tempo cruzou-se comigo nestas longas caminhadas pejadas de partidas e chegadas, deixou sinais que não posso esquecer e restos de esperanças que quero reter...há lembranças que se vão desvanecendo tal como a tarde, percorre-me o sonho na claridade do teu olhar, onde a felicidade e a ternura são canção de embalar...os meus dedos de menina escrevem umas linhas de amor, e nas tuas mãos, esconde-se a lua vestida a rigor...

natalianuno

quarta-feira, 18 de outubro de 2017

outro rosto...



os meus pensamentos desviam-se, insulto o sol que me queima o corpo e me incendeia a alma,  volta, traz contigo os sonhos que sonhámos e as conversas esquecidas para que não se percam, não sei onde estás, só sei que a inquietação me atravessa o coração e na boca trago o sabor amargo da tua ausência, logo hoje que a lua beija as varandas antigas e os meus dedos tentam arrancar-me as veias, os meus pulsos mal se aguentando, ouço-me num longo silêncio e assim atravesso a vida, meus passos já conhecem o caminho, talvez não vejas, talvez não sintas mas as rugas detêm-se ao redor dos meus olhos, e há dias em que a saudade me passa ao lado...

natalianuno

réstia de doçura...



bem vindo o azul da noite sobre o rosto verde da folhagem, logo é a hora em que os corpos se enrolam, as bocas se juntam, famintamente se amam... a janela continua aberta, recebendo o vento amável, só ele testemunha o absoluto deleite do amor entre quatro paredes... vai implorando morrer entre os amantes...encostada a uma esquina a lua traja de prata, alheia à janela aberta, tocando com os lábios a terra a seus pés e, deslumbrada, olha cada palavra que o poeta frustrado, coloca sobre o papel branco da côr das flores da magnólia, e deixa num verso uma réstia de doçura..

natalianuno

outono na alma...



já se perdem minhas folhas neste outono tardio assoladas pelo vento da saudade... hoje ouvi as harpas do canavial,e recuperei o sorriso, subitamente vieram-me as lembranças às águas da memória, e de lembrança em lembrança voei caindo no silêncio...sento-me no chão, sou agora um vaso quase vazio onde repousam flores sem vida... e a borboleta que voeja na desordem da minha folhagem caída...pergunta-me: que fizeste da vida? fico-me silenciosa, e olho a minha triste caligrafia, as palavras caem da boca como frutos maduros, e as sílabas já não querem mais voar...
natalia nuno

sábado, 14 de outubro de 2017

desânimo...



às vezes sinto-me só, num mundo estranho, de esperanças poucas, e sentindo que nada posso mudar avanço nas horas sem remos, debaixo de calor, onde me basta saber-me viva...perco até as palavras e aguardo pela paz em mim...então faz-se aurora e eu sou a viagem e sigo minha trajectória...
natalia nuno

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

rio da vida...



por te sentir e amar, sinto angústia por te perder, é dado amar sempre mais, não importa que um de nós adormeça primeiro, quem ficar agasalhará no peito a primavera deste amor...como se nada houvesse mudado...nada separa o que não pode separar-se...numa pequena barca atravessamos o rio, desatentos, não demos pelo tempo que caminhou ao nosso lado, breve, como a sombra duma ave que passa...
natalia nuno

quinta-feira, 12 de outubro de 2017

saudade ...



o outono abrigou-se...desnorteado, à espera que as abelhas fiquem sonolentas e o sol ajoelhe, espalho palavras na eira dos sentidos e grito aos pássaros que as deixem amadurecer...não, não tomei outro caminho, nem outro barco nem outro rio, sigo a voz que talha o meu silêncio na calada da noite...reconheço ainda as papoilas que habitam meus dedos... são quase tudo que carrego da madrugada, que já vai longe...

natalia nuno

à procura....



ando à procura de sonhos onde possa abrir caminhos aos salpicos de sol, aos sorrisos vestidos de branco, à imagem escondida no recanto da memória, aos fios brancos de cabelo da minha fisionomia, e à minha velha ânsia que continua a debater-se...antes que tudo me sufoque...
natalia nuno

quarta-feira, 11 de outubro de 2017

rosto que não encontro...



rastejam sóis em busca de poentes...enquanto recolho o cheiro das maresias pelos atalhos do outono, há um rosto que não encontro, escapou-se para longe de mim, ele que era a minha blusa de domingo...o tempo avaro o pegou! agora perdida nas horas onde tu és ainda, morre-me o tempo de ti, mas o sol não afrouxará apesar das sombras...hoje nem os pássaros saudaram o nascer do dia, e no meu coração a saudade fez ninho de mil maneiras... e trouxe até mim a nostalgia! resta o cheiro das amoras, e a tristeza de ser cântaro sem água, tocou-me o outono e fez de mim uma imagem desfazada...

natalia nuno

desabafos...



seus passos foram feitos para andar, não para se arrastar, às vezes formula frases indistintas  em contemplação ao que a vida lhe oferece, e no seu interior há sempre uma força que a anima...uma ilusão persistente que a persegue e que faz com que esqueça os estragos na alma que a vida conseguiu retirando-lhe a paz aquietadora do coração...nas horas de silêncio que passam por ela, reflecte sobre como rapidamente passou a juventude também a chegada da velhice e, como seu rosto morreu escondendo a alegria num sorrir mudo, onde o silêncio toma conta de tudo...ouve a voz do seu desassossego, já não vai haver um amanhã diferente, é agora como carta amarrotada deitada ao chão da indiferença, tudo é diferente sim daquele tempo de menina, o que sente é demasiado forte e doloroso e chama-se saudade...esboçada aguarela de rosto macilento, triste como a noite, triste tela sem vida nem florescimento...

natalianuno

quinta-feira, 21 de setembro de 2017

entre a noite e a insónia...



olha de novo o céu de nuvens cinzentas, seus pensamentos ledos e tristes vagueiam perdidos, a ternura que a percorre é como a frescura da manhã, caminha solitária e seus passos são lentos como o gotejar da mais íntima fonte, nos olhos molhados traz a saudade, mas no coração, sempre a mesma sede de abraços...seu sorriso de  murta e jasmim vai-se abrindo almejando seu desejo de horizontes, já foi esbelta e harmoniosa e hoje se surpreende, o tempo a deixou de fulguração despida, cansada, mas grata à vida por a deixar envelhecer aguarda a noite que lhe traz sempre um sigiloso fogo d'alguma felicidade... ouve de novo o beber das palavras pela folha de papel, e uma luz fugidia desliza sobre o tecto dos seus pensamentos, aproxima-se e evade-se  é a recordação a querer fugir-lhe, o peito aperta-se e ela permanece imóvel no silêncio de destroçados muros, permanece na espera que se abram clareiras e possa ser de novo flor imprevisível nascida das águas, seja sede, seja fragrância e de novo fogo e ternura para que possa inventar sonhos e ter tempo ainda de felicidade...quererá deixar pegadas na areia e se o vento as arrasar, sentir-se-à cada vez mais indefesa,  apagar-se-à sobre si mesma, será o final sulcado pela morte.

natalianuno

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

a chegada do outono...


o outono já se faz presente, na sua escura fragrância, é um jardim na penumbra...a sua luz é sensual, passa o seu tempo numa quieta agonia, é tempo de inacabados sentimentos, vai-nos desfigurando as feições e despindo a vida em silêncio, fala-nos com voz melancólica, sutura-nos as feridas, para que nunca mais voltem e desfralda um arco-íris em nós para que a memória não se esfume, quer que perpectuemos o valor da vida para que não se apaguem recordações, e nem sorrisos que arrancamos aos sonhos... tranquilo amigo é este tempo de outono...que se importa que continuemos cuidando de nós, mesmo no frio das horas..olho o horizonte e procuro por aquele fogo feliz, e já não sinto e não sei por quanto tempo seguirei neste mundo a que pertenço, as ruas são incertas e fugidias e as sombras aumentam, sinto o mundo a desabar fico sentida e muda de olhar quebrado, estremecem os rios do meu corpo e o vento adormece no meu peito...

natalianuno

sábado, 16 de setembro de 2017

viajantes da memória




que difíceis se fazem as palavras quando queremos falar daqueles dias em que o sol girava nas nossas mãos, e a vida tinha um som distinto e tomava seu rumo dando-nos felicidade, deixou-nos um sabor nostálgico, horas talvez mais solitárias, mas ainda assim o sorriso sempre aflora e a saudade que abraçamos nos traz bem estar... hoje estamos mais alheios ao rumor da vida, é maior o silêncio que nos toca...mas ainda entrelaçamos as mãos com a emoção da juventude, enquanto raios de luz se dissipam no nosso horizonte...somos viajantes da memória, lembrando encontros furtivos, cartas d'amor e sonhos loucos vividos por nós nesse Setembro distante, quando as primeiras folhas caindo ao chão falavam carinhosamente lembrando-nos que tudo acaba e como tal vivêssemos os momentos de poesia, saboreando a chama para não deixar que se apagasse...hoje gasto a caneta e as palavras a recordar e fico assim enquanto a morte não chegar....

natalianuno

sexta-feira, 1 de setembro de 2017

fogo da ternura...



a carência de ti não me abandona, invento tempo de felicidade... meus olhos abertos pelo fogo da ternura voltam a embebedar-se de alegria num beber lento e doce, e a memória volta àquele momento distante quando comecei a desejar-te... e penetrou no vale agreste do meu coração a luz mágica do amor, cujo aroma encantador ainda conservo na memória, o teu corpo, o teu perfume, o aproximar dos teus lábios, até do mais pequeno gesto eu guardo a recordação...caminho imenso já percorrido, os momentos mais doces são ainda testemunhos dum amor que permanece em mim, fecho os olhos e vejo uma imensidade de imagens que me dizem mais que mil palavras e são minha recordação constante...o sonho me harmoniza a vida!... o tempo ficou para trás, às vezes o peito se enche de frio dum pavor desconhecido, como se já fossemos sombras ou cinzas, vamos avançando às cegas, até que um dia ficaremos com os pensamentos difusos e adormecidos como crianças...

natalianuno

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

perfume...sonho




ainda que tivessem passado décadas tudo continua igual na minha memória já um pouco desarrumada, visões íntimas a encher os meus sonhos de fontes a correr recobrando o seu precioso canto, e o tremor das árvores a despertar na primavera...o perfume do entardecer vindo dos pomares, e o vento batendo nos loureiros da beira rio...lugar onde guardei o meu universo...
as horas passam, horas da minha vida e a saudade e este amor férreo à vida não me abandona, morrerá comigo... trago manchas claras no rosto e minhas pernas de avestruz não são mais leves e airosas, também o olhar anda desprovido de vida, o tempo agita-se vai riscando os dias do calendário...escondo o rosto nas mãos e deixo fluir ainda aquele sonho que arranco dos retratos, baloiço-me na cadeira cheirando uma flor...

natalianuno

nostalgia dum tempo...



rostos bonitos......chega-me alguma tristeza, mas, não desvio o olhar, porque no fundo há uma sensação indispensável e que me dá uma certa felicidade, respiro profundamente e sonho o tempo que também passou por mim, quando nem o choro me deformava o rosto... e tudo me prometia uma vida tão intensa e feliz...

natalianuno

sábado, 15 de julho de 2017

céu sem nuvens...





olha o céu de nuvens despido, seus pensamentos ledos e tristes vagueiam perdidos, caminha numa procissão de passos, traz búzios nas mãos serenas, nos olhos enxutos gaivotas de esperança, mas no coração uma sede de abraços...na mente carrega andorinhas de negro, cansada já vem de longe e à vida se faz, e a noite lhe traz sempre um novo sonho... ouve o beber das palavras pela folha de papel e é como se escutasse Deus na sua escrita, tece e destece a realidade, e amanhece pensando na idade que é quase noite, as palavras vão golpeando o seu céu e cravam abismos na alma sem piedade...mas ela sempre renasce e resiste esperando de novo alto sol na noite que carrega... o vento refresca-lhe as pupilas e canta no seu coração em plenitude, trazendo-lhe as sílabas precisas que pousam nos poemas... como um abrir de portas a uma vida que sempre se renova...no entanto algo mudou, não será a mesma que foi, e essa estranheza lhe dói.

natalia nuno

terça-feira, 11 de julho de 2017

assim o queira o coração....

súbitamente acodem as memórias como se fossem doces passarinhos que animam as esperanças de mais um dia...o tempo não vence as lembranças, assim o queira o coração, nelas colho uvas doces, e frutas silvestres...fica meu peito animado, tornam claro o meu dia e mais dourado o sol, restauram o meu alento, trazem-me uma paz doce, ausento-me numa liberdade gostosa, minha vontade é regressar apenas no inverno na esperança de o suportar, ver Dezembro chegar e com lucidez, quem sabe continuar a caminhar...talvez! partir, hei-de partir, não vou queixar-me da sorte, a morte é bem certa e logo aperta o peito, sigo a minha estrela, o caminho está feito...

natalianuno

terça-feira, 20 de junho de 2017

já não corro, mas voo...





estava eu tão feliz naquele momento, o dia claro, umas nuvenzitas brancas e todas as chaminés da aldeia fumegando, brilhavam meus olhos num rosto apetecido à espera dum jovem por mim enlouquecido...no meu corpo passou o silêncio e voei como uma andorinha em busca da primavera do amor, tanta doçura nos olhos, tanto bravor no coração, tanta juventude...é bom regredir no tempo, abraçar de novo o sonho agora que sou o barco preparando-me para partir levando a recordação do amor vivido permanente no pensamento... este é o retrato duma mulher madura, frágil, triste e desassossegada, lembrando a inesquecível adolescente de pureza intacta, hoje esmorecida num lamento, trazendo em si uma luz nostálgica e enternecida no olhar...escancaro as janelas da minha alma, deixo para trás o desencanto e vou continuando a sonhar, dissipando as minhas névoas, desprendendo-me da realidade, misturando realismo, imaginação e ternura quando a vida já pesa...

natalia nuno

domingo, 18 de junho de 2017

o aroma das lembranças...





acendi o candeeiro a petróleo da mesa verde, onde permanece a jarra com um lírio à minha espera, a casa retém o cheiro a lareira acesa um hálito que tolda meu coração e a certeza... é o ninho que deixei! - uma cotovia ainda se instala no telhado arrulhando baixinho, e posso sentir em suspenso todas as vozes que ainda percorrem a minha memória, aqui fico cativa com o intento de fazer perdurar o sonho... lá fora a trepadeira assiste a tudo, urdindo cegar-me com a sua beleza... quantos degraus havia?- sete, como recordo com nostalgia!- no terraço o vento quebra o silêncio, sento-me na cadeira do pai , escrevo aos ausentes e dobro-me perante a saudade que me assalta nesta momento....há um rio de água cálida que me abraça pela cintura, e um loureiro que me despe a alma com ternura, tudo me oferecem mas me negam, tal como o tempo me nega o rosto e eu sinto o desgosto...ouço um ranger, vai agora o sol a prumo, talvez seja meu pai de volta entreabrindo a porta  e meu coração de alegria se solta, cresce o pó na minha lembrança, afasto a cortina, adentro-me em mim mesma e deixo-me a sonhar aqui na casa da ladeira...onde eu fui por inteira... criança, lírio silvestre da ribanceira....

natália nuno

quinta-feira, 15 de junho de 2017

o retorno do sonho...





ofusco-me na lembrança do teu corpo, cresce o frio das primeiras sombras...anunciam-se as estrelas nas janelas da alma, é inquietante o silêncio enquanto as horas destilam...ali ao lado desperta um pintassilgo que faz tremer as folhas, chilreando nos ramos da minha saudade, o sol deixou de incendiar as veredas do meu coração, vou seguindo o rasto do sopro da tua voz ao meu ouvido, há lembranças que me esperam , sinto-lhes o cheiro molhado das maresias e sonho com as cores das flores que me oferecias, e, assim se faz manhã na minha noite escura e esta felicidade o meu coração inunda de ternura... as laranjeiras olham-me, trazem-me frutos d' ouro e eu sonho-me menina... adoça-se o vazio, esqueço o ardil do tempo... mas, abrevia-se a minha alegria, retorno do sonho, deixo o paraíso para enfrentar o inferno...sou uma criança confusa vinda do éden da minha infância, refugio-me nas palavras como borboleta trémula, olho meu poente cinzento e volta a mim o receio de como seguir o jogo do destino dos meus passos... deixo-me ir nesta utopia que me leva...

natalia nuno

sexta-feira, 12 de maio de 2017

remota história...



o silêncio e o esquecimento andam perdidos no tempo,num solitário jardim que é o teu corpo e o meu, terra de aromas que retorna de quando em quando a sentir o alfabeto dos pássaros, o sorriso das flores que chega aos nossos olhos, a luz das estrelas que nos enlaça, e o sol  com lânguidos fulgores  que nos tatua a pele ...passam por nós andorinhas com acordes de violino no ar puro da manhã ainda adormecida, chega em nós o outono com uma pincelada de sol, sorrimos à luz que nos acaricia e às nossas mãos chega o meio da tarde, porque o meio dia já se foi numa rajada de vento, assim se define o que existe entre a felicidade e a tristeza, amo-te mesmo no silêncio e esquecimento, e sonho-te na inteira juventude, sonho este que é remota história, velho sonho de ébrias estrelas que brilharão no adeus à tarde, enquanto os arvoredos levarão nossos medos, deterão o tempo e desdobrarão a presença da cor no nosso amor...serás o último pássaro levado nas ondas do vento até às sombras das ramas, e eu esperarei por ti entre os abetos para ouvir-te dizer, que para sempre me amas...

natalianuno

sexta-feira, 5 de maio de 2017

inventário de esperanças...



abraço a vida, cada dia é uma oferta inesperada que vou transformando numa eterna tarde de domingo à espera do crepúsculo...olho a valsa que as folhas mortas executam sobre a poça d'água e vou decantando recordações enternecedoras, viajo no tempo e a imaginação corre sempre à frente, lavrando versos de risco e de beleza, para que a palavra não morra num tempo ignorado com a presença do silêncio...o coração recolhe um oceano de ternura que vai crescendo das linhas das minhas mãos e fixando-se na textura do papel, arrepia-se minha pele, e eu reescrevo fragmentos da minha vida, sendo eu o primeiro leitor que tudo leio com amor, e me interrogo, valerá a pena partilhar?- quem amará este inventário de esperanças, quem delas desdenhará?- eu habito aqui nas suas margens e vou perdendo o rumo da força, vai-se embaciando o olhar numa despedida silenciosa, numa indiferente solidão, os anos me levam perante todos os olhares e esvaziaram  meus olhos, deixando-os ao relento no entardecer... vão procurando o seu próprio alento.

natalia nuno

ser poeta...



Está dito que não é coisa fácil. Poesia é coisa séria, desista qualquer escritor de a tentar criar, não é por saber muito, nem muito bem saber escrever, poeta pode ser até analfabeto, porque a poesia lhe vem da alma, lhe nasce dum dom que possui
do qual nada o fará desistir por mais que tente. O Poeta se afeiçoa à Poesia, vem-lhe da grandeza dos seus sentimentos, e ainda que os outros lhe apontem defeitos, ele a acha uma obra superior.
Entristece se lhe fecham as portas, se o excluem, alegra-o o poder contribuir, satisfaz-lhe a amorosa admiração dos amigos,
tal como ele com sensibilidade e riqueza de expressão, numa serena ou sobressaltada esperança de dar o seu melhor.
Na Poesia se expressam sentimentos de saudade, de sofrimento, de amor...haverá  porventura mais belo? Nada se lhe pode igualar! A poesia é um impulso que vem da alma,  testemunho de autenticidade.
Eu e a minha mania da prosa...vou tentando, isto que hoje escrevi é o que sinto, os poetas são gente, por outra gente julgados loucos.

natalia nuno

ouvindo Chopin...



Estou nas nuvens ouvindo Chopin, subo montanhas, distancio-me do Mundo, esqueço as encruzilhadas da vida, e fico grata a Deus, por me dar a opção de ficar por lá até querer, quem sabe esqueça o caminho de regresso...sento-me numa nuvem branca, e voltarei em Maio, num dia lindo, haverá lilases a rebentar, e eu, irei viver a vida até ás minhas últimas forças.Os meus olhos verdes herdados, olharão uma e outra vez o mar, também o sol até desaparecer no horizonte, assim amansarei a saudade, e aligeirarei a minha ânsia.

natalia nuno

lembranças...



Hoje lembrei... nasci num dia em que o rio galgou as margens e alagou as hortas,  soltou-se livre.
Tal como ele, eu, brava nascia, não sorri nem pestanejei, gritei, trazia comigo a impetuosidade e a curiosidade p'lo Mundo onde acabava de chegar.
Dentro de mim ainda essa criança pequena, num sopro de inspiração, lá volto à infância, onde a vida tinha outro sabor, e é um amargo doce que a recordação me provoca. Para além da criança, lembro a adolescente que conservo com comovido afecto, feliz, descontraída, assim a recordo.

Orgulho-me da aldeia, amo os que lembro com saudade, pobres materialmente. mas ricos interiormente, foram eles que deram sentido e esperança ao meu desabrochar.
Hoje lembrei também dos rapazes de mãos rudes e gestos desajeitados e dos bailes onde tanto me divertia. Há uma história que conto a mim mesma diáriamente que jorra desta fonte que é o meu passado.
Passeio pelo Mundo onde me deixo enfeitiçar por belos recantos, mas é sempre a volta à aldeia que profundamente mais me absorve, onde a memória fica viva e clara.
A aldeia e eu seduzimo-nos mútuamente, há recordações que acarinho e evoco nas minhas horas silenciosas e sombrias.
E assim me vou distanciando, sentindo-me um ponto ínfimo no final do caminho.
Meu corpo já não me pertence, devora-me o tempo, mas a Poesia reconforta-me um pouco, e a memória é guardiã do arquivo das minhas lembranças.
Repito para mim:
«Tu és ainda muito nova»
Tudo não passa de ilusão
A imagem que vês no espelho
pedindo socorro não és tu,
essa não!
Carrega aos ombros aquela que só tu vês
Tu és, a que vive dentro da tua memória
Essa é que és!
A que sonha que há-de ir mais além
Já sem nada de seu
Há-de sorrir como ninguém
Como águia, voar p'lo céu.
Conquistar a Vida
Pois nasceu para voar
Olhos bem despertos
Ouvidos bem abertos
E de emoção gritar.
Que és eternamente jovem!
Sofres  da passividade
de ver o tempo a passar
Mas na saudade
Sabes o coração reconfortar.

natalia nuno
rosafogo

capricho




Ontem não vimos o sol, choveu sem violência, e ficámo-nos a olhar o rio, esse rio que já é oceano, surgiram mais umas rugas nas têmporas, enquanto as nuvens se afogavam na luz morna da tarde. A noite é agora carvão e o horizonte já abraça o crepúsculo, e eu recordo o dia de ontem, pois a amizade me arrancou um sorriso.
Amanhã uma luz macia trará um novo dia, e eu serei o que sou por quanto tempo DEUS quiser, me enviará um sopro doce do vento para me adoçar o peito, que pende um pouco para a tristeza.

A vida vai-se prolongando
e botões de lírio (sonhos) vão despontando.


natalia nuno

quinta-feira, 13 de abril de 2017

estremecimentos...



com a excitação duma adolescente acalento a esperança de dias de sóis, e deixo-me contagiar pelo aroma que brota dos laranjais, esqueci meus ais, leio cartas d'amor em voz alta afectuosamente e sinto-me gente, com um sorriso de piedade acabo por cair em letargia...assim se passa mais um dia...olho ao redor com afecto tantos sinais de vida, só meu coração é um horizonte de escombros e os meus olhos um céu esborratado a reprimir as lágrimas... estranhos sons me martelam a mente... ou será desvario? no sonho corro numa lezíria rosada onde o tempo não passa, ao longe o traço dum rio, e sonhadora sou como uma vela que não se consome, os anos não contam, eu sou  dona do tempo, flutuo no aroma das rosas, reflicto, colho um profundo silêncio,  deixo-me embalar no balouçar da aragem, e assim amenizo a cansativa viagem...são agora as sombras rendilhadas que me cobrem, a tarde me apazigua, palpitam meus dedos na escrita... eu sonhadora derrotada pelos meus sonhos, a retirar da obscuridade esta minha metade...

natalia nuno

segunda-feira, 20 de março de 2017

costumeira saudade...




um fogo breve é já a vida, é folha que cai ao chão e conhece sua velhice, é o obscurecer da beleza que não volta, é lágrima de resignação.é escutar o doentio lamento da alma...no fragor da festa tudo era surpresa a arder na carne, a iluminar o rosto, ternos sonhos, nada comparável ao tempo dos amores cujos ruídos agora se apertam no peito como cristal cortante que acaba de se partir perante os nossos olhos embora na penumbra...mãos dóceis eram outras que vão perdendo o tacto, e há um riso triste ocupando o quarto de janelas fechadas, onde só o espelho vai golpeando o futuro... murcham as flores na jarra imaginária, queimando o olhar longínquo, e irrompem as carências dum amor nunca descoberto, caem aguaceiros, oscilam os sonhos, e a chuva nos olhos bate sem piedade... rasgão do tempo de Outono que caprichosamente lhe assoma com a saudade...

natalia nuno

segunda-feira, 6 de março de 2017

loucura...



baloiço entre os sonhos e a vida num abraço de peculiar ternura e tudo são fascinações, lembranças de instantes perdidos, já distantes... na minha cabeça os ventos do outono, tão só a nostalgia me ouve, procuro romper as húmidas paredes que cercam meu olhar, retirar a presença fria que me cerca, trocar os dias monótonos por momentos felizes, e ter de novo essa força decidida que cria doçura e é amor...enruga-se o rosto, os olhos que eram estrelas ficam pássaros ocultos em quietude, enquanto vou repetindo palavras de pranto, de desejo candente, de frescura longínqua, simultaneamente sentimentos que me restam e a necessidade sonhar... o sonho sempre abarca felicidade, e traz-nos uma lágrima que nos afoga de saudade, incendeia desmemórias, e é como se o sossegado amor estivesse sempre à nossa espera...com as palavras faço colheitas de sonhos e neles sou uma violeta azul solitária flor, uma safira no rio, ou uma inquieta gazela...sou tudo o que eu quiser... enquanto na minha mão um melro cantar  sem idade e sem tempo...

natalía nuno

sábado, 4 de março de 2017

lago de palavras...



as palavras puxam pela memória, às vezes como instrumento de tortura  ficam dançando no cérebro, rodopiando com loucura e, numa irreflectida emoção incitam-me à decisão de escrever sentindo nisso  prazer e como de costume, a saudade arma-me o laço ... fico a baloiçar, saudade é sentimento  muita vez doloroso e a emoção perturba e destrói o coração... escrevo então um lago de palavras onde coloco o mais bonito cisne branco sob a luz das estrelas...criado do nada, surgindo do oásis da minha mente... e o que até então parecia inalcansável,  pela exigência da saudade torna-se possível, surge o poema com uma estranha sedução e a sede dum rouxinol ardendo na memória...coloco a inquietude na frescura dos verbos e a dor vivifica nas metáforas,  faço juramento que não lavrarei mais versos, nem sequer pequenos fragmentos, deixarei meus pensamentos no silêncio, na dor que passa, onde me exilarei sem retorno como lenda ao abandono...como o recolher duma flor...numa tarde de outono...

natalia nuno

sábado, 25 de fevereiro de 2017

sou tua...pequena prosa



não sei por quanto tempo vou caminhar, da garganta do tempo me vem esta solidão e é com ela que vejo meu mundo a desabar...ecos chegam de alguma voz distante e em lufadas de vento percorrem-me o pensamento, enquanto meus dedos crepitantes continuam a escrever, a agarrar-se à poesia como arpões, aos poucos morrendo de ilusões e nas janelas das minhas insónias procuro ainda o sonho e pequenas sensações que espalho em meu alento, sem que nada nem ninguém as destrua, porque o sonho é meu e nele eu sou tua...há uma sombra que surge denunciando passos e apesar da decadência eu sonho ainda com teus abraços...constante e cega, vivo nessa loucura da qual já não há volta, nesta fria obscuridade abro de par em par o coração deixo nele à solta para sempre a saudade.

natalia nuno

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2017

violenta-me o tempo...



quando fecho os olhos, alcanço estrelas que me iluminam no silêncio turvo das palavras, visita-me o futuro, e o frio trespassa-me até aos ossos, que mistério esconde?... acato o destino, as palavras concedem-me a dúvida que me deixa numa indefesa inquietude...tremem as minhas horas, abandono-me entre o monte e a urze e ali fico semente, a aguardar por germinar ainda um pouco mesmo sendo a minha estação o outono...sussurra-me o vento, trazendo-me sensações de velhas recordações e a minha memória, irrompe como uma borboleta cujas asas já mal se se sustêm, ainda assim, vive nelas a lembrança dum amor vivaz...o tempo pôs a sombra no meu rosto, enquanto o sol se escondeu no arvoredo, o silêncio se fez com chicotadas na mente, na boca palavras errantes e vazias, e no olhar os raios prateados da lua, a velar-me os pensamentos.

natalia nuno

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

agitada corrente...



fui diluindo memórias em palavras sentidas, em pequenas prosas, tal como areia engolida pela mar, resumo de anos vividos, com emoção, numa torrente de sussurros e quimeras que o coração não quis calar...audaz nas ideias. numa caligrafia errante fui levantando velas na fúria dos ventos, navegando nos sonhos, numa agitada corrente até me deixar tranquila numa nostálgica saudade...de repente a imaginação cai no vazio e, lá se vai meu próprio alento para um vale escondido, onde a única face é o silêncio e a noite desolada, apagada numa única lágrima que me afoga... e o mar que em mim pulsa segue o seu destino...enquanto o eco da memória me recrimina pela vida que se apaga num sopro frio e solitário...e me traz a saudade de menina.

natalia nuno

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

no mutismo do olhar...



quem me procura, o que se passa? desfaz-se a lua, o silêncio me oprime, a madrugada começa...entretanto o coração pulsa nas paredes aguardando a decisão da morte...as palavras voam e transformam-se nos meus dedos, os pensamentos surgem solidários e a escuridão fica mais ténue e eu começo a sonhar até ao feliz esquecimento de mim própria...abro a janela de par em par e esqueço o rosto quase sem vida que afinal é ainda o meu, aquele, que com uma confusa lágrima se acaba ao recordar o feliz tempo que tanto amava... e uma flor sempre renasce no mutismo dos meus olhos e nos meus dedos de solidão ainda há um rodar de ardores, promessas, sonhos, que florescem desesperadamente...chega assim à plenitude, todo o tempo que perdura em mim.


natalia nuno 
rosafogo

domingo, 8 de janeiro de 2017

estendo o olhar...



um murmúrio perdido que ninguém ouve ela traz  da infância, quando habitava um lugar de luz, hoje sombra escurecida... é pássaro que dá bicadas no vazio e ninguém dá pela sua presença. sussurra palavras trémulas e distantes que ninguém ouve e são como enfaroladas nuvens prestes a derramarem num chão com rumor a agonia, e ao mesmo tempo é ainda juventude ou apenas memória numa confusa dualidade... pôs o sorriso no esquecimento, por desejo ou capricho escreve poemas acariciando as palavras que despertam na sua memória, o sonho é a chave do seu viver... o seu corpo é a languidez da tarde onde o Sol já dormita, astro que sempre a acompanhará no silêncio turvo dos versos, numa solidão crescente, até que um dia o pulsar acabe...e nada mais perturbe o seu silêncio, nem lhe negue os seus desejos...um agasalho a cobre, feito de livros e folhas de papel onde a aguarda sempre um poema que quer conquistar...

natalianuno